quarta-feira, 28 de outubro de 2009

POEMA DE SETE FACES


Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo,
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

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Carlos Drummond de Andrade
(in Alguma Poesia)
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(Também eu, às vezes penso, que Deus anda esquecido: num descaso comigo - pegando pesado.
Até parece que Ele não sabe o quão fraca sou. E o quanto não sei ser só.)

Um comentário:

Luciano Paltian disse...

Tá afundada na pessoa do Pessoa, Mairinha. O custo-benefício daquele livro tá alto, hein? Vai mais uma do ôme então: "Poesia é apenas a minha forma de estar sozinho". Abraço.